*Adriano Damasceno
Os mutirões judiciários têm se propagado Brasil afora como um mal necessário. Digo mal porque qualquer um que milite na seara jurídica – se não agir de má-fé – tem plena consciência de que a Função Jurisdicional do Estado brasileiro precisa de mudanças estruturais, e os mutirões não se prestam a tanto.
O fato, porém, é que os mutirões aí estão. E sendo assim, o ser humano há de usar aquilo que tem a sua disposição. Afinal, melhor tirar algo de positivo da situação que ficar lamentando o reduzido número de juízes e servidores, os entraves legais, orçamentários, o baixo investimento em tecnologia (pelo menos a que deveria chegar a todas as comarcas do país), etc.
O grande problema surge quando os mutirões, ao revés de ajudar, pelo menos um pouco, a desafogar a chamada “taxa de congestionamento” processual, terminam por criar um imbróglio ainda maior. Isso é o que pode ocorrer caso a sede de celeridade se sobreponha às regras processuais.
Após a edição da Lei 11.719/2008, o Processo Penal brasileiro passou a ter como regra a identidade física do juiz (art. 399, §2°), até então rechaçado pelos Tribunais Superiores (Vide, por exemplo, o HC 91.176/RJ, Rel. Ministra JANE SILVA, QUINTA TURMA, julgado em 11/12/2007, DJ 07/02/2008, p. 1). Em termos simples, o juiz que presidiu a instrução processual, teve contato direto com as provas, é quem deve sentenciar o feito. Nada mais natural.
É óbvio que a regra comporta exceções, tanto que os Tribunais têm aplicado analogicamente o disposto no art. 132 Código de Processo Civil, que, ao contrário do Código de Processo Penal, além de determinar que o juiz que tenha presidido a instrução profira a sentença, previu as exceções óbvias, como férias, licenças, aposentadorias e promoções.
Voltando ao cerne da questão, o equívoco dos mutirões realizados em varas criminais surge quando as audiências não são feitas de modo concentrado, com instrução e julgamento em sequencia, oralmente, como determina a lei seja a regra. Os processos então se acumulam e qual a solução? O bom e velho mutirão.
Junta-se, então, um grupo de juízes para julgar processos com os quais nunca tiveram contato na vida. Tem-se, de fato, uma grande quantidade de sentenças. A maioria, todavia, passível de reconhecimento de nulidade decorrente da não observância da regra da identidade física do juiz, que aos olhos de causídicos atentos implicarão num número tão grande quanto de recursos e habeas corpus a entupir e entravar os Tribunais.
Os mutirões são válidos e necessários, ao menos enquanto não chegarmos à Função Jurisdicional desejada por todos. No entanto, é preciso cuidado. Atropelos e falta de atenção à legislação só geram mais e mais processos. É preciso entender que, salvo casos específicos, o juiz que presidiu a instrução está melhor preparado para proferir a sentença – tanto que a lei determina que assim o seja – , principalmente quando o que está em jogo é a liberdade de alguém.
*Defensor público Estado do Maranhão
Publicado no suplemento Direito e Justiça de O Imparcial.
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